20091101

um político de memórias adiadas

O político, que tinha tido intervenção de relevo em vários domínios dos negócios públicos, achava que tinha algumas coisas a contar. O contacto, da sua iniciativa, foi feito. A partir do que sabia da sua vida, achei igualmente que existia um número suficiente de dados com interesse para partilhar. Foram feitas algumas conversas exploratórias, necessariamente longas. Logo aqui, achei que existia ainda demasiada dispersão na vida do político para este ser capaz de se concentrar num trabalho tão meticuloso. Mas ele insistiu. Foram combinados os temas a tratar, e uma metodologia de trabalho, já de si num formato pouco exigente, o único possível perante a intensidade e a imprevisibilidade que caracterizavam o quotidiano do político. Na verdade, apesar de toda a flexibilidade e adaptação aos imprevistos, o problema era insuperável. A verdade é que o político não era capaz de se resguardar para a tarefa a que se tinha proposto: não fazia o trabalho de casa, não seguia a metodologia, não conseguia manter qualquer regularidade. Não tinha sequer possibilidade de concentração durante o tempo de trabalho em conjunto. Ao fim de alguns meses, aconteceu o inevitável. Os encontros foram rareando, até terem deixado de existir. Perdeu - se muito tempo mútuo e a passagem das memórias a papel terá de esperar por tempos onde menos aconteça.